sexta-feira, 30 de outubro de 2009

"Meias-Verdades" - Capítulo 11: "Preconceito e Hipocrisia"

A reação dos dois era de estranheza. Tanto da parte de Alberto quanto da parte de Cristina, o questionamento fez-se presente. O silêncio foi cortado depois de alguns segundos.

- Oi, eu gostaria de falar com o Jorge.
- Ele não está! Posso avisar à ele que você veio aqui.
- Não, não precisa. Eu passo mais tarde, ou talvez amanhã...
- Ele não deve voltar nem hoje, nem amanhã... O Jorge viajou!
- Ah... Não sabia.
- É, foi pro Rio de Janeiro...
- Ah, vim chamá-lo para... bom, esquece!
- Qual seu nome?
- Cristina.
- Eu dou seu recado, Cristina... Você ia chamá-lo para...
- Nada demais! Eu espero até que ele volte - respondeu uma desanimada Cristina.



A cabeça de Jorge doía. Saía sangue de seu supercílio, de seu nariz e de um dos cantos de sua boca. O corpo todo estava dolorido e lhe produzia uma forte dor de cabeça. Um dos três motoristas saíra de seu carro impaciente, já gritando palavrões ao fotógrafo. Crianças de dentro do carro, provavelmente os filhos do homem, olhavam assustados para o nervoso pai que pelos gestos parecia estar instigando uma briga no meio da rua. A motorista do outro carro encontrava-se parada diante do volante, desacordada. Jorge foi até o carro para ver se a mulher estava em boas condições, e por sorte, constatou que o caso não devia ser demasiadamente sério. Em segundos, seu caos havia se multiplicado. Teria que esperar ali por uma viatura policial e provavelmente ambulância e carros de reboque.

Ligou para Alberto, que atendeu ainda entorpecido.

- Oi, Jorge!
- Oi, Beto! Como você tá?
- Cara, não estou entendendo nada até agora... Eu estava tentando entrar no seu apartamento e não sei como estou aqui dentro! Mas não me lembro como cheguei a entrar aqui, cara...
- Depois te explico! Isso, até eu já sei. Olha, Beto, eu liguei mesmo só pra saber como você estava... Acabei de bater o carro e estou esperando fazerem todos aqueles procedimentos insuportáveis pra sair daqui.
- Uma amiga sua veio te visitar. O nome dela é Cristina, parecia bem interessada em você...
- Ah, não! Ela é só minha amiga mesmo, Beto. E além do mais, você sabe, né... Não tenho preconceito nem nada, mas não é do tipo que me atrail... bem, as morenas... Eu gosto de branquinha e ela, você viu, é...
- Negra! E uma linda negra! E é uma hipocrisia de sua parte dizer que não tem preconceito! Lógico que tem, olha o que você acabou de dizer!
- Não, Betão... Trata-se de não sentir desejo, que nem eu não consigo sentir por... animais, objetos, árvores, por exemplo.
- Mas consegue sentir por loiras, morenas, ruivas...menos negras.
- Ah, Alberto! Não é hora de falar sobre isso agora. Depois conversamos, vou fazer o B.O. agora - Jorge se aborrecera por seu amigo estar questionando seus princípios e opiniões. - Tchau!



A praça estava fria e escura. Nem o sol fazia do lugar um ambiente mais quente. Lúcia estava lá, postada diante do banco de madeira em que Marina encontrava-se sentada. A novata se levantou, sem entender muito bem quem era aquela mulher de saias longas e cabelos dispostos em uma presilha no formato de borboleta próximo à nuca.

- Oi!
- Oi? Quem é você?
- Meu nome é Lúcia. Estou aqui a pedido do Jorge.
- Ah...Hum...O Jorge então...não vem hoje?
- Não, ele está viajando!
- Mas como eu vou pegar o...
- Ele já deixou comigo! Não sei o que tem aqui dentro, mas já está comigo. Ele me pediu para lhe entregar e avisar que não sabe se estará aqui em uma semana...
- Há! O Jorge é engraçado! Ele acha que pode comandar, mas esquece que quem manda aqui sou eu. Como ele ousa me dar regras...
- Mandar no Jorge? O que você é dele?
- Ah, você não sabe, pelo visto. Olha, não posso te contar, mas avise àquele fotógrafo de merda que eu quero ele aqui na semana que vem ou não guardo mais nada...
- Pode deixar que darei o recado - disse uma sorridente Lúcia.

Virou e entrou novamente no carro. Seguia com os olhos a jovem loira, que em poucos minutos abria um portão que dava acesso à um corredor escuro com escadas ao longo do mesmo. Viu que não demorou muito para a luz de uma das janelas do primeiro andar ser acesa. Nesse instante, Lúcia sai do carro e vai até um bar próximo, onde fica à espera de algum movimento no provável apartamento de Marina. A luz da janela se apaga e não se houve mais nenhum tipo de voz, ruído ou ventilação, sequer. Lúcia espera por alguma diferença. Em vão...


[CONTINUA...]



Por Pedro Henrique Castro.





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